Sérgio Moro: Não há ofensa mais grave do que a daquele que trai o mandato parlamentar e a sagrada confiança que o povo nele depositou para obter ganho próprio |
Na sentença que condenou o ex-deputado Eduardo Cunha
(PMDB-RJ) a quinze anos e quatro meses de prisão, o juiz federal Sergio Moro
aproveitou para mandar um recado aos parlamentares sobre o projeto de lei de
abuso de autoridade, homenagear o ministro falecido do Supremo Tribunal Federal
Teori Zavascki, rebater as críticas às delações premiadas e fazer considerações
éticas sobre o uso do mandato parlamentar em benefício próprio.
No despacho, o juiz titular da 13ª Vara Federal do Paraná
escreveu que, se não forem observadas as “salvaguardas necessárias”, a medida
de abuso de autoridade funcionará, na prática, para criminalizar a
interpretação da lei e ameaçar a independência judicial, “subordinando-a ao
interesse dos poderosos”. A proposta está para ser votada na Comissão de
Constituição e Justiça (CCJ) do Senado na próxima semana.
Moro também relembrou em diversos momentos do texto o
“saudoso” ministro Teori Zavascki, que afastou Cunha da presidência da Câmara e
encaminhou a ação penal referente a ele à Vara de Curitiba. O juiz de primeira
instância afirmou que o “legado de independência e seriedade” de Teori não será
esquecido.
Foi atribuido ao peemedebista os crimes de corrupção, lavagem de dinheiro e evasão de divisas, o juiz da Lava Jato discorreu sobre a grandeza de exercer um cargo eletivo |
“Não há melhor momento para recordar o legado de
independência do ministro Teori Zavaski do que agora, quando discute-se a
aprovação de nova lei de abuso de autoridade que, sem as salvaguardas
necessárias, terá o efeito prático de criminalizar a interpretação da lei e com
isso colocará em risco a independência judicial, subordinando-a ao interesse
dos poderosos. Espera-se e confia-se que o Congresso saberá proceder com
sabedoria para a adoção de salvaguardas explícitas e inequívocas”, escreveu
Moro.
Ao atribuir ao peemedebista os crimes de corrupção, lavagem
de dinheiro e evasão de divisas, o juiz da Lava Jato discorreu sobre a grandeza
de exercer um cargo eletivo. ”Não há ofensa mais grave do que a daquele que
trai o mandato parlamentar e a sagrada confiança que o povo nele depositou para
obter ganho próprio”, escreveu. Moro ainda rebateu os críticos do uso da delação premiada nas
investigações, dizendo que eles são “favoráveis à regra do silêncio, à omertà
das organizações criminosas”.
Ele prosseguiu dizendo que, se não fosse às
colaborações, muitos crimes complexos ficariam sem solução. “Crimes não são
cometidos no céu e, em muitos casos, as únicas pessoas que podem servir como
testemunhas são igualmente criminosos”, completou.
Sobre o presidente Michel Temer, que foi arrolado como
testemunha de defesa de Cunha, o magistrado escreveu que, “para evitar
mal-entendido”, não há registros de que o presidente tenha atuado em favor do
ex-deputado para libertá-lo. Com o argumento de que Cunha continua tentando
“constranger e chantagear autoridades públicas”, mesmo estando preso, Moro
determinou que ele continuasse atrás das grades na fase recursal. “Não pode o
Judiciário ceder a qualquer tentativa de chantagem”.
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