No caso de deputados e senadores, a transição será proposta pelo próprio Legislativo – e o histórico recente mostra que seu padrão é legislar em causa própria. |
São Paulo – A reforma da Previdência, anunciada ontem, veio
mais dura que o esperado por muitos economistas. O governo pode ter exagerado
para manter uma margem de mudanças na negociação com o Congresso sem desfigurar
a proposta.
“É uma boa proposta para endereçar os problemas fiscais de
longo prazo do sistema, com uma idade mínima adequada para a altura de 2030 e
confesso que mais dura do que eu imaginava”, diz Fábio Giambiagi, economista
especializado em Previdência.
A participação dos gastos previdenciários dentro das despesas públicas federais dobrou desde 1991, de 10,5% para 19,5% do PIB |
O momento político é de turbulência e a reforma das
aposentadorias é mais complicada do que a do Teto de Gastos, apesar de ser uma
decorrência lógica justamente dele. Se não for feita uma mudança nas
aposentadorias e for colocado um limite de crescimento real zero nos gastos
públicos, em pouco tempo a Previdência pode tomar conta do Orçamento inteiro.
A participação dos gastos previdenciários dentro das despesas
públicas federais dobrou desde 1991, de 10,5% para 19,5% do PIB. Conheça
algumas das polêmicas que já estão aparecendo diante da proposta do governo:
No caso da Previdência, o ponto central é garantir a sustentabilidade futura do sistema diante do envelhecimento da população. |
Militares, policiais e
políticos:
Os militares são pelo menos por enquanto, a grande exceção da
proposta. O governo diz que a aposentadoria deles será eventualmente modificada
por um projeto de lei paralelo.
“A exclusão dos militares é ruim do ponto de vista político,
mas não faz o menor sentido considerar que as pensões militares são o grande
problema previdenciário. É uma questão de proporção: as pensionistas militares
implicam uma despesa de 0,2 % do PIB e o INSS de 8 % do PIB”, diz Giambiagi.
Já
bombeiros e policiais militares terão regras definidas pelos estados. No caso
de deputados e senadores, a transição será proposta pelo próprio Legislativo –
e o histórico recente mostra que seu padrão é legislar em causa própria.
Não será mais possível acumular pensão e aposentadoria: o beneficiário vai precisar escolher. |
“Criar excepcionalidades para militares e políticos vai pegar
muito mal com a população e dá margem para resistência. Foram muito incisivos
nos programas sociais e pouco nas classes que todos vemos como privilegiados”,
diz Nelson Marconi, coordenador executivo do Fórum de Economia da Fundação
Getúlio Vargas (FGV).
As pensões foram alvo de fortes revisões. Não será mais
possível acumular pensão e aposentadoria: o beneficiário vai precisar escolher.
O novo cálculo do valor pago à viúva ou ao viúvo, por exemplo, será de 50% do
valor do benefício recebido pelo contribuinte que morreu com um adicional de
10% para cada dependente do casal.
“No momento que a viúva mais precisa você imagina tirar esse
recursos. É uma economia boba, considerando que as famílias tem cada vez menos
filhos”, diz Paulo Tafner, que estudou Previdência por décadas no Ipea
(Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada).
Aposentadoria rural:
As vezes o trabalhador está numa situação tão precária que não tem como acessar o sistema |
Os aposentados rurais terão uma alíquota de contribuição
maior do que hoje, a ser definida em lei própria posterior. “O trabalho rural é
completamente diferente do que era antes, então é natural que você tenha maior
similitude com as regras do setor urbano”, diz Tafner.
Ele nota que a força de trabalho rural hoje é de apenas 10%
do total e que a Justiça é responsável por forçar a concessão de dois a cada
três aposentadorias do setor rural porque mesmo com os critérios mais frouxos
hoje em vigor, o trabalhador não consegue provar os requisitos.
Já Marconi diz que o déficit da Previdência rural é tão alto
que uma contribuição pequena não vai nem de longe resolver o problema. Ele
defenda a criação de novas fontes de financiamento para isso: “As vezes o trabalhador
está numa situação tão precária que não tem como acessar o sistema”.
Regras de transição e
idade mínima
As regras de transição são muito brandas para os próximos anos, o que fará que a despesa do INSS continue a crescer a taxas elevadas no próximo governo. |
Nada muda para quem já recebe aposentadoria ou para quem já
tiver completado as condições de acesso durante o período de tramitação. As
regras novas valem integralmente para homens com 50 anos ou menos e mulheres
com 45 anos ou menos no momento da promulgação. Homens com mais de 50 anos e
mulheres com mais de 45 anos estarão sujeitos a regras de transição.
“As regras de transição são muito brandas para os próximos
anos, o que fará que a despesa do INSS continue a crescer a taxas elevadas no
próximo governo. Defendo é que o próximo governo proponha uma nova reforma para
dar conta especificamente disso, já que o atual não terá como”, diz Giambiagi.
Esse parece ter sido a tônica do ajuste fiscal até agora.
Como os gastos públicos são muito rígidos e crescem por inércia, o foco tem
sido em mudar a trajetória para ganhar tempo e recursos para movimentar a
economia no presente. No caso da Previdência, o ponto central é garantir a
sustentabilidade futura do sistema diante do envelhecimento da população.
O ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, disse na segunda-feira que 1 em cada 3 brasileiros é idoso. Em 2060, serão 1 em 3.. |
“O desenho pro longo prazo está certo, mas no curto prazo não
tem nenhum impacto grande”, diz Marconi. O ministro da Fazenda, Henrique
Meirelles, disse na segunda-feira que 1 em cada 3 brasileiros é idoso. Em 2060,
serão 1 em 3.
A idade mínima de aposentadoria é definida pela reforma em 65
anos e deve ser ajustada de acordo com a evolução da expectativa de vida
definida pelo IBGE (que subiu de 66,6 anos em 1990 para 75,2 anos em 2015). Por
enquanto estão previstos dois ajustes de um ano até 2060, disse Caetano, o que
elevaria a idade mínima de aposentadoria para 67 anos até lá. Segundo Tafner,
esses ajustes automáticos tem se tornado comuns em vários países.
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